A dúvida de João Batista

1. A crise ministerial de João Batista


João Batista havia sido preso na fortaleza Maqueros, perto do Mar Morto, por causa da crítica feita a Herodes que havia tomado por mulher a esposa do seu irmão. João Batista foi o profeta precursor e anunciador do Messias, considerado por Jesus o maior do profetas.


João Batista, embora tivera experiências profundas com Jesus no ato do batismo, agora mostrava relutância e dúvida em crer que ele de fato era o Messias. A dúvida de João Batista colocava em dúvida o seu próprio ministério, assim, o Batista estava passando por uma profunda crise ministerial, certamente tinha a ideia de que o Messias seria um libertador no modelo de Moisés. Sua dúvida é aumentada pela prisão e talvez achasse que o Messias pudesse tirá-lo de lá se realmente fosse o Messias, mas isto não aconteceu. Cristo na verdade nem vai visita-lo, isso gera uma grande crise ministerial em João Batista.


A resposta de Jesus: “bem-aventurado é aquele que se não escandalizar em mim” (v. 6), é um indicativo de que João Batista estava se equivocando quanto à real identidade e propósito do Messias.


João estava disposto a esperar “outro”, de acordo com a pergunta dos seus discípulos. Pois Jesus não atendeu as expectativas políticas e libertárias que eles esperavam. Se fosse usar a linguagem atual, Jesus não era marxista, mas sim, um implantador do Reino dos Céus nos corações humanos. Mas isso não significa que este Reino não se estende às dimensões terrenas, pois ele mesmo deu a resposta aos discípulos de João indicando que várias classes de pessoas até então excluídas agora estavam sendo abençoadas: os cegos, os paralíticos, os leprosos, os surdos e os pobres. Até os mortos são ressuscitados. Jesus repetiu para João o que Isaías havia predito sobre o Messias.


A resposta de Jesus também indica que a quantidades de milagres não é garantia de fé, pois estes João sabia que estavam acontecendo, mas fé é um salto no escuro, como disse Kerkegaard, no sentido de apostar naquilo que não é aparente, crer no invisível, depositar a confiança na esperança das que coisas que se esperam. Neste sentido de Jesus, a fé é continuar confiando mesmo estando preso, como no caso de Joao e enfrentando circunstâncias difíceis.


As palavras de resposta de Jesus a João Batista servem de consolo para ele, notem que Jesus não lhe manda dizer nenhuma outra palavra. Jesus enfatiza para João que a fé contraria as circunstâncias, tanto as de João que estava preso, quanto as de Jesus de quem João supostamente esperava outra coisa.

 


2. Jesus ratifica o ministério de João Batista


Jesus afirmou que João não era nem indeciso como uma cana agitada pelo vento nem comprometido com as benesses do palácio real, pois se vestia de forma grotesca e comia gafanhotos e mel silvestre. Jesus aproveita para fazer um comparativo, pois suas roupas não poderiam entrar num palácio real, por isso a comparação com as roupas finas dos palácios onde Herodes habitava, demonstrando que nem sempre a verdade está nos palácios, na maioria das vezes está com o profeta rejeitado.


Por causa da seriedade de João Batista e pelo motivo de anunciar Jesus, ele afirma que o Batista é o mais importante dos profetas, embora nunca fez nenhum milagre a não ser pregar o arrependimento e anunciar a vinda do Messias.

 


3. A indiferença espiritual do povo


Nem a pregação da Lei e do ascetismo com João Batista, nem a pregação da liberdade graciosa de Jesus, agradaram os judeus da época, certamente isto também ajudou a aprofundar a crise de João. Eles esperavam o Messias político, mas este veio com o Reino dos Céus que habita o coração de cada ser humano.


Nem choraram no funeral nem dançaram na festa, não quiseram nem João Batista nem Jesus. Eles não queriam a radicalidade da severidade de João Batista mas também não queriam a leveza da presença e da pregação de Jesus. Eram como garotos mimados que rejeitavam as melhores propostas de brincadeira que seus companheiros faziam, preferindo ficar emburrados nos cantos escuros e vencidos da Lei Mosaica, não levando em conta o novo tempo que Jesus estava anunciando e inaugurando.


Interessante observar que Jesus foi chamado por eles de amigo de publicanos e pecadores, porque eles, os tradicionalistas, não se misturavam com gente de má fama, mas Jesus não tinha nenhum preconceito com nenhum tipo de gente, ele se ajuntava a toda gentalha desprezada pela religião da época e lhes trazia esperança, salvação e cura. Isto foi motivo de levantarem calúnias contra Jesus, o chamaram de comilão e bebedor de vinho, pois andava com esta gente de má reputação.

 


Conclusão


As explicações que Jesus faz ao ministério de João Batista demonstram uma divisão nítida na história da humanidade: que “a Lei e os profetas duraram até João”. Agora, um novo tempo se inaugurava, o evangelho e o Reino dos Céus haviam chegado com toda a sua força. Por isto o autor aos Hebreus afirmou que: “Quando ele diz Nova, torna antiquada a primeira. Ora, aquilo que se torna antiquado e envelhecido está prestas a desaparecer.” Hb 8.13


Portanto, tudo aquilo que não for confirmado pelo Evangelho de Cristo deve ser abandonado como espúrio e antiquado, agora, a nova maneira de viver do Reino dos Céus deve ser buscada.


Será que estamos atentos aos sinais do Reino dos Céus entre nós, ou estamos como os judeus não reagindo nem a brincadeira do funeral nem a brincadeira da dança nas praças? O Reino de Deus é real e já está presente, pois Jesus o rei está entre nós!


Todos podemos passar por crises existenciais e ministeriais, isso foi normal até com aquele que Jesus disse ser o maior dos profetas, portanto, nenhuma culpa ou condenação deve haver nas crises e descrenças da vida. O que se deve fazer é o que João fez, recorrer a Jesus, ele desfaz todas as crises com sua resposta amorosa e acolhedora, reafirmando quem somos, assim como reafirmou a grandeza do ministério de João Batista.


“Aprendemos esse descansar em Deus, essa fé, mais preciosa que o ouro passageiro, unicamente quando Deus nos tira o chão de baixo de nossos pés e nos conduz para dentro de abismos em que não o entendemos mais. É necessário que, na pessoa de Jesus e também no nosso próprio caminho de sofrimento, reste algo que jamais compreenderemos. Somente então poderemos experimentar o que está contido na palavra “Bem-aventurado o que não se escandaliza comigo, que não se deixa abalar por nada na confiança em mim”.” (Comentário Esperança, p. 127).


Jesus pregava sobre o Reino dos Céus e não somente nos céus e aqui nesta passagem sobre João Batista ele apresenta um aspecto interessante deste Reino: a libertação das enfermidades e opressões das pessoas em um mundo cruel.


A Igreja é um sinal do Reino na terra, mas não é o Reino. Jesus pregou muito sobre o Reino de Deus (dos Céus), de como se fazia para entrar nesse Reino, e aqui ele está enfatizando que deve ser tomado a força, ou seja, que exige um certo esforço humano, com a direção e auxílio do Espírito Santo, para viver neste Reino, pois exige a aniquilação das vontades próprias em detrimentos das vontade do Reino; dos egoísmos para o compartilhar do Reino; da perversidade para o amor do Reino. Isto é uma escolha diária difícil, por isso Jesus disse que é preciso usar a força, contra as trevas que nos tentam tirar deste Reino.

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